quarta-feira, 11 de junho de 2014

Cena XXI-CT-CIMPOR - Alhandra (1975)

- Outra vez o Santos (Muleta Negra) –
O já nosso bem conhecido Artur Santos, também conhecido pelo Muleta Negra, tinha nesta obra, além da função de angariador de mão-de-obra, a de zelar pelo funcionamento das instalações do pessoal. Neste período conturbado, ele nunca teve medo das ameaças da Comissão e enfrentava-a mesmo, quando a isso era obrigado. Nunca escondeu a sua simpatia pelo PPD de Sá Carneiro e ameaçava os comissionistas, dizendo: “se alguma vez me tentarem sanear, garanto que lhes limpo o sebo a todos!”
Bem, isto para dizer que eu, tirando partido da situação, resolvi pregar uma partida às duas partes, isto é, ao Santos e, indirectamente, aos que o perseguiam ideologicamente. Para isso, redigi uma carta dirigida ao Muleta Negra, como sendo escrita e remetida pelo Núcleo de Moscavide do PPD. Francamente, nem sabia se existia algum centro político com aquele nome, mas, para o caso tanto fazia. A intenção era arranjar maneira de dar ao Santos mais poderes e confiança, que o motivassem nos combates verbais que travava, amiudadas vezes, com os inimigos de ocasião.
Peguei em letras de borracha, daquelas que, na altura, se usavam para fazer legendas em desenhos e, com elas, fiz uma composição que dizia:
PARTIDO POPULAR DEMOCRÁTICO
- Núcleo de Moscavide –
            Coloquei o endereço, em nome do Artur Santos, selei o envelope, dirigi-o para a obra da Cimpor, em Alhandra e, na ida para o ISEL, desviei para a estrada de Moscavide, onde o meti num marco de correio. Além de mim próprio, quem mais sabia disto era o meu colega Dionísio Pinheiro. E, dois dias depois, lá chegou a missiva à posse do Santos. E sabia que ela chegara, porque o nosso amigo não esperou muito tempo para dar largas ao seu contentamento, correndo a mostrá-la a todos os que ele considerava serem influentes na manobra política da obra. Para isso, caminhou até ao Armazém e foi dá-la a ler ao chefe da Comissão, Manuel Simão. Depois, seguiu para o escritório e, aqui, além de ter mostrado o conteúdo da carta a mim e ao Dionísio, passou pela Sala de Desenho e fez o mesmo aos que lá trabalhavam. Não satisfeito, foi mostrá-la ao diretor da obra – na altura o engº Amaral – e percorreu parte da obra dando conhecimento daquele facto que, para ele, era primordial no confronto com os comunistas.
            No momento em que o Santos me entregou a carta para ler, confesso que senti uns calafrios. Pensei, e disse ao Dionísio:
            — Tu queres ver que este gajo é capaz de ir ao PPD de Moscavide para agradecer os elogios de que é alvo na carta e, ao mesmo tempo, mostrá-la àqueles PPDs!? Isto, admitindo que existe mesmo aquele Núcleo… mas cheira-me que, mais cedo ou mais tarde, a bronca vai estalar.
            O meu colega ria e ria, mas eu é que já não achava graça à cena. Deixei passar mais um ou dois dias, para não quebrar o sonho do Muleta Negra, e achando que era altura de esclarecer o caso, chamei o Santos ao escritório e, só com ele naquele espaço, desfiz o tabu. Como era de esperar, o nosso amigo não acreditou que a carta fosse falsa. Mas perante a garantia de como e o porquê da mesma, um bocado a custo lá se convenceu. Pedi-lhe que queimasse a carta, para que não viéssemos a ter problemas com o PPD, mas ele, pensou melhor e propôs-me:
            — Sr. Caria Luís, agora sou eu que lhe peço para não divulgar a falsidade da carta. É que assim, sempre que os comunistas me chateiem, eu mostro-lhes que posso fazer-lhes frente.
            A obra estava perto da sua fase final. Desde a hora em que saí para outro local de trabalho - que, no caso, era Marrocos - nunca mais vi o Muleta Negra, o tal PPD que não suportava comunistas.

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Extrato de "DEGRAUS E MARCOS DA VIDA", Vol. II

terça-feira, 3 de junho de 2014

50º aniversário da Inspeção Militar


 GRANDE RAPAZIADA!
Em 1944 nasceram, em Vale da Pinta-Cartaxo, quinze almas do sexo masculino. 
Depois da passagem dessas individualidades pela Primária, cada qual seguiu o seu tortuoso caminho, até serem considerados "homens" que, já encorpados, poderiam e deviam prestar o seu contributo à Pátria, militarmente falando.
Antes, porém, houve dois mancebos (eu e o Roberto), cada qual pela sua razão, que acharam por bem optar pela "deserção" do grupo e enveredar pelo voluntariado, no ramo da Força Aérea. Os outros treze foram, em junho de 1964, encaminhados para aquele ritual da Inspeção Castrense, à mercê, portanto, da Inquisição Militar do Exército. Salvo duas exceções que, por questões que se prendiam por quaisquer insuficiências físicas, foram "libertados", aos restantes onze foi lida a cartilha que, segundo a mesma, eram os "contemplados" obrigados a dar o corpo ao manifesto, em prol da Pátria e do Sistema. A maioria acabou por ir parar ao então chamado Ultramar, passando a fazer parte dos combatentes da Guerra Colonial. Felizmente que, desta malta, todos voltaram sãos e salvos.
Acabadas que foram as campanhas militares e tendo cada qual seguido o seu caminho profissional, fosse por isto ou por aquilo, nunca mais ninguém se "lembrou" de promover um encontro dos membros do grupo de 1944, que, até ao ano 2000, passaram por um total jejum no que a confraternizações dizia respeito. 
Sei que, depois da mudança de século, alguém se lembrou, enfim, de tentar uma aproximação dos "rapazes" e eternizar o evento. Eu, devido ao facto de estar ausente da terra por motivos profissionais, só comecei a participar no evento no ano de 2008, ano em que atingi a idade e o estado de Reforma.
Mas, por muito estranho que pareça, eu, estando fora, não era o único faltoso nem mesmo poderia ser considerado um refratário. Se um tipo reside em Oeiras, em Lisboa, em Tomar, ou mesmo em Aveiro, poderá argumentar que, enfim, está "longe" e não lhe dá jeito nenhum vir à terra uma vez por ano? E eu, que resido no Porto? Mas estes que refiro, ainda são uns bacanos, se os compararmos a um colega que, residindo a tempo inteiro em Vale da Pinta, renunciou ao convívio desde 2010. Há quem diga que foi motivado por "isto", outros afiançam que foi por "aquilo". Seja como for, se é por dispender 20€ por uma refeição bem "regada" e tendo o pazer de confraternizar com os "amigos de 44", e ainda com transporte gratuito, não me parece que tais atitudes sejam plausíveis. No entanto essas ficam com quem as pratica. Seja por comodismo, snobismo ou sovinice, acho que têm que aguentar com as críticas.
Independentemente do número de convivas, vamos acreditar que para o ano há mais.

Fig. 1 - ano de 2009 - Adega do Avô - Casais da Amendoeira
Fig. 2 - ano de 2013 - Cernelha - Cartaxo
Fig. 3 - ano de 2014 - Cernelha - Cartaxo - 50º aniversário