
Os 1ºs de Dezembro. Como eu os via.
Em tempos que já lá vão, pelos anos 50 do século passado, já o Gregoriano assinalava o dia 1 de Dezembro. O nosso 1º de Dezembro, em terras de Vale da Pinta, caraterizava-se de modo muito simples, mas muito significativo. Pela madrugada reunia-se a Banda de Música que, de modo célere, percorria as principais ruas da terra. Era em marcha apressada que o fazia, porque, na época, o dia não era feriado, e os músicos (quase todos trabalhadores rurais) tinham o compromisso de iniciar a sua jornada laboral ao nascer do sol. O horário, que alguém estipulara para a faina rural, era de sol-a-sol. Mesmo nos dias em que em que o astro rei não se deixava ver, a duração do tempo de trabalho afinava sempre por esse diapasão.
Ainda hoje a iluminação pública em Vale da Pinta não será famosa, mas, naquela altura, ainda com pouca "rodagem", pouco mais watts debitava que a fidelíssima candeia de azeite, de torcida, que ainda alimentava muitas casas da terra. Ora, atendendo a que esta condição era um óbice para que a Banda tivesse um desempenho aceitável, havia que tentar melhorar as condições e, para tal, melhor remédio não havia do que recorrer a uma meia dúzia de voluntários que, marchando por entre as filas dos músicos, e de Petromax à cabeça, tropeçando aqui e ali, lá iam dando luz àquelas sombrias pautas. Não era que o trecho fosse desconhecido dos intérpretes; muitos deles até sabiam aquilo de cor e salteado, mas com os candeeiros de camisa e petróleo sempre a coisa ficava mais facilitada.
A certa altura da marcha, quando alguém se apercebia que havia por perto uma porta que se abria, e dela saía uma alma caridosa que se propunha doar uns figuitos passados, umas broas de milho e uns cálices de aguardente, passava a palavra ao músico Silvestre Caipira, que, na figura de maestro interino, dava ordem de paragem ao cortejo e, em simultâneo, o início da beberrice. Isto, como está bom de ver, tanto para os músicos como para os acompanhantes. Muitos destes, sabendo que, numa ou noutra casa, havia figos e bagaceira de borla, à descrição, trocavam o "vale de lençóis" pela friagem agreste da madrugada invernosa, só para satisfazerem as suas gulas alcoólicas. Que me lembre, ninguém rejeitava carga. E se, àquela hora da madrugada, estava iminente o ritual diário do "matar o bicho"... de graça, melhor seria.
Mas era assim que, durante algumas décadas, se comemorava o 1º de Dezembro na minha terra.
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