segunda-feira, 15 de julho de 2013

Cena VII - O Muleta Negra no Carregado


Onde se fala de cromos, excêntricos e golpistas

- Santos: o Muleta Negra -    

À semelhança do que acontecia nas outras obras onde trabalhei na adolescência, já relatadas no Volume I, também nestas apareciam aqueles indivíduos que, por isto ou por aquilo, patenteavam uma certa excentricidade; porque fugiam ao comum comportamento do cidadão normal, eram rotulados de cromos, excêntricos ou morcões. Durante a minha estada nesta obra, entre 1966-1969, muitas peripécias ocorreram, mas seria fastidioso esmiuçá-las todas. Esta, que se segue, é a que, por agora, pretendo realçar. 

 Este nosso amigo era um fulano que se chamava Artur Santos, mas que toda a gente o conhecia por Muleta Negra. Era assim alcunhado devido a dois fatores: um, porque ele funcionava como muleta no suporte à empresa, em termos de angariação de pessoal para as obras, e como a sua tez, por demais negra, devido ao surro, era evidente… O outro motivo, terá sido devido ao facto de existir na altura um toureiro de meia-tijela, que apareceu por aí com aquele pseudónimo. De tão fraco ele era, que desapareceu de cena tão lesto como aparecera. Este Santos tinha como função principal percorrer certas zonas do país, na angariação de mão-de-obra para as obras em curso. Ele tinha um prémio de 50$00 por cada trabalhador que apresentasse no escritório da obra do Carregado, para isso, e para facilitar a mobilização, ele prometia mundos e fundos que, como se depois se constatava, não poderia garantir. Por isso é que, de vez em quando, ele aparecia na obra com os olhos amarrotados e, ao vê-lo naquele estado, já todos sabiam que a gama de aparelhos de televisão, frigoríficos, tratamento de roupas e até mulheres, por ele prometidas, não tinham sido distribuídas pelas Construções Técnicas aos trabalhadores por ele angariados.

O Muleta Negra, vindo de uma obra da Somague, creio que da Barragem do Carrapatelo, queria fazer crer a todos com quem falava que, antes de ser barragista, fora empregado da Citroen, em França, onde tinha a profissão de experimentador de carros. Ora eu estou em crer que este mentiroso compulsivo, nem um Dumper sabia conduzir, quanto mais um Citroen boca-de-sapo…

O Santos protagonizou outros episódios, noutras obras que, a seu tempo, serão narrados.
 


Extrato do VOL.II de "DEGRAUS e MARCOS da VIDA"

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